A data de 21 de março é considerada o Dia Internacional de Combate ao Racismo, o momento é propício para discutir o significado histórico desse fenômeno como uma estratégia para combate-lo. O racismo como todo conceito, passa por diversas modificações ao longo dos processos históricos, conforme a transformação cultural da sociedade. No caso brasileiro, a palavra racismo comumente remete de imediato às relações estabelecidas para com a população negra, em função do passado colonial escravagista e sua negação com o advento da ideologia da miscigenação e da democracia racial. Com os estudos sobre a questão racial no Brasil, especialmente após o Projeto UNESCO na década de1950, o racismo é identificado como componente das relações mais cotidianas, ainda que a sociedade negue sua existência em função dos modelos de segregação racial dos Estados Unidos e África do Sul. A temática é bastante complexa e os estudos seguintes foram mapeando diferentes formas com que o racismo se manifesta nas relações sociais no Brasil. Atualmente discutimos o racismo a partir da dimensão estrutural, institucional, internalizado e intersubjetivo é importante entender que é o mesmo fenômeno, agindo em dimensões distintas e complementares.
Para fins didáticos e diagnósticos eficientes esses desdobramentos são necessários para o desvelamento de seus mecanismos de funcionamento e assim sua superação. Aqui elegemos conversar um pouco sobre o racismo intersubjetivo, pois são relações que ocorrem entre indivíduos e envolvem as subjetividades individuais daqueles que interagem. O racismo intersubjetivo ou interpessoal manifesta-se de forma objetiva nas relações entre as pessoas, ainda que as pessoas envolvidas não tenham consciência de que estão sendo racistas ou sofrendo racismo. Ou seja, por um lado observamos objetivamente uma injúria racial quando uma pessoa xinga outra por ser negra e o xingamento está marcado pelo fator raça/cor, por outro, há casos que nem o agressor nem a vítima se dão conta que se trata de racismo, no entanto, permanece constituindo uma evidência objetiva do crime. Ou seja, a manifestação do racismo internalizado ocorre na relação interpessoal e é objetivamente detectada independente da consciência dos envolvidos. Assim, a pessoa negra que foi xingada por um atributo da sua raça, mesmo que ela não se dê conta disso, outras pessoas que observam a situação são capazes de identificar a atitude racista de quem a distratou, e aquele que xingou, mesmo que não reconheça que foi racista, ainda assim, o xingamento nesse caso é a evidência objetiva de sua atitude racista.
O contexto social marcado pelo mito da democracia racial nos incutiu uma falsa noção de que não há problema de racismo no Brasil, o tratamento diferenciado dispensado a pessoas negras é justificado por algum outro motivo, nunca pela raça/cor, no entanto é fruto do racismo internalizado que deve ser o primeiro a ser combatido. Para isso, é fundamental que educadores e educadoras prestem atenção nas próprias atitudes e busquem identificar como fomos forjados num ideário racista, mas temos o dever de combater primeiro em nós, para que nossas atitudes não continuem reproduzindo as mesmas práticas e mantendo a mesma estrutura racista. Eis aí o nosso grande dilema!
CARVALHO, Lílian Amorim. 15 anos da Lei 10.639?2003: Temas, conceitos e dilemas. In: FELIPE, Delton (org). Educação para as relações étnico-raciais: estratégias para o ensino de história e cultura afro-brasileira. Maringá: Mondrian Ed, 2019 p.11-32.