IMPROVÁVEIS: trajetórias de homens pretos de camadas populares rumo ao ensino superior

Esta tese expõe os resultados de uma pesquisa que teve como objetivo analisar a trajetória de homens pretos heterossexuais de camadas populares que chegaram ao ensino superior público, visando compreender como se deu a construção da perspectiva de longevidade escolar para eles (e suas famílias) e o que precisaram mobilizar para a construção dessas trajetórias exitosas. Sendo o grupo de homens negros, estatisticamente, o que menos acessa o ensino superior (IBGE, 2021; ARTES, UNBEHAUM; 2021), interessou a esta pesquisa investigar como a noção de masculinidade negra, muito associada à violência, à lascividade e ao não cultivo da intelectualidade (RIBEIRO, 2015; hooks, 2022), atravessou seus percursos e influenciou a busca pelo ensino superior. A pesquisa empírica foi realizada em Salvador/BA, foram entrevistados quatro participantes e utilizou-se como técnica o estudo de caso, para a construção de perfis, inspirados em “retratos sociológicos” (LAHIRE,1997; 2004). Os dados mostraram que cursar o ensino superior não foi um projeto de nenhum deles e nem de suas famílias, mas que apoios e incentivos familiares, escolares e a inserção em atividades extraescolares foram importantes no percurso e para a fomentação da ideia de ter um diploma. Os resultados demonstraram que os participantes apresentaram distanciamento de configurações de práticas associadas a uma noção estereotipada de masculinidade negra e apresentaram como principal motivação para os estudos a busca por melhores condições objetivas de vida. A regulação moral dos comportamentos imputada pelas famílias desde a infância, a fim de formarem um ideal de homem respeitoso e trabalhador, distante dos estereótipos associados à masculinidade negra, os aproximou de características valorizadas no âmbito escolar. Essas famílias construíram um ethos de valorização escolar e ofereceram suporte, a seu modo, para que eles pudessem manter-se estudando sem trabalhar. A frequência a
instituições fora do contexto de seus bairros e mais próximas ao ensino superior na adolescência contribuiu para que circulassem pela cidade, desenvolvessem outros interesses que, ao mesmo tempo, os distanciava da realidade de seus bairros de moradia e pares e os aproximava do ensino superior, e para que tivessem contato com agentes que forneceram conselhos, incentivos e informações sobre a universidade. Nessa fase, foi necessário que eles tomassem para si e por si a construção da chegada ao ensino superior, revelando a necessidade de terem autogerência e autodeterminação (TERRAIL, 1990; VIANA, 1998). Os resultados indicam, ainda, um padrão de forte vinculação às instituições escolares e aos docentes na escolha dos cursos em que ingressaram no ensino superior.

Como citar...

MIRANDA, Luciana Aparecida de. IMPROVÁVEIS: trajetórias de homens pretos de camadas populares rumo ao ensino superior. Tese – UNICAMP. Campinas, 2024

Luciana Aparecida de Miranda

Licenciada em Letras Vernáculas (UEFS) e em Pedagogia; Especialista em Educação com ênfase em avaliação (UNEB); Mestra na área Multidisciplinar de Ciências Humanas e Sociais (UEFS) e Doutora em Educação (UNICAMP). Participei dos grupos de pesquisa: “Linguagens Visuais, Memória e Cultura” (LVMC), na UEFS e “Educação, Instituições e Desigualdades” (FOCUS), da UNICAMP. Atualmente participo do grupo “Desenvolvimento Humano e Processos Educativos” (DEHPE), na UEFS. Tenho interesse de ensino e pesquisa em temas relacionados a desigualdades educacionais e desigualdades sociais, sociologia da educação, educação e juventude, educação superior, raça e gênero, educação e diversidade cultural, trajetórias educacionais desde a infância e literatura infantil e juvenil.

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