1º de Maio: o trabalho no Brasil tem cor, gênero e território

Escrito por: Nathália Rodrigues
Revisado por: Helen S.

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O Dia 1º de Maio, reconhecido mundialmente como o Dia do(a) Trabalhador(a), remonta às mobilizações operárias do século XIX, quando trabalhadores e trabalhadoras lutaram por direitos fundamentais como a jornada de oito horas, melhores salários e condições dignas de trabalho. No Brasil, essa data também é marcada por reivindicações, greves históricas e disputas por reconhecimento. No entanto, é necessário sublinhar que, nesse cenário, a população negra segue enfrentando um duplo desafio: a exploração de classe e o racismo estrutural.

Ao olharmos com atenção para a composição da classe trabalhadora brasileira, percebemos que o 1º de Maio não pode ser tratado como uma data universalista, desprovida de recortes. Pelo contrário, é preciso racializar esse debate e reconhecer que o trabalho no Brasil tem cor, gênero e território.

A herança colonial e o racismo como base da organização do trabalho

Durante mais de três séculos, o Brasil organizou sua economia sobre o trabalho forçado de pessoas negras escravizadas, retiradas à força do continente africano. O fim oficial da escravidão, em 13 de maio de 1888, não significou liberdade efetiva. Sem acesso à terra, moradia, educação ou emprego formal, as pessoas libertas foram lançadas à exclusão social. O Estado brasileiro optou por políticas de embranquecimento e imigração europeia, ignorando as populações negras como sujeitos de direito.

Esse abandono institucional deu origem a um sistema de trabalho fundado na marginalização dos corpos negros. Até hoje, as profissões mais precarizadas, informais e desvalorizadas seguem sendo ocupadas majoritariamente por pessoas negras – uma herança direta da escravização que ainda se reproduz nos números do mercado de trabalho atual.

A luta negra no mundo do trabalho: entre resistência e reinvenção

A história da classe trabalhadora negra no Brasil é também uma história de resistência. Desde os quilombos, passando pelas irmandades religiosas, associações de trabalhadores negros no pós-abolição, ligas operárias e sindicatos, até os coletivos contemporâneos de juventude e mulheres negras, há um legado de organização política e enfrentamento às opressões que deve ser celebrado e valorizado.

Formas alternativas e coletivas de trabalho criadas por pessoas negras têm sido historicamente implementadas: o afroempreendedorismo, as cooperativas de mulheres negras, os projetos de formação política nas periferias, os espaços de economia solidária e os territórios quilombolas que geram renda com base em saberes ancestrais e sustentáveis. Esses caminhos desafiam a lógica capitalista de exclusão e mostram que outra economia é possível.

Por um 1º de Maio com justiça racial

O Dia do(a) Trabalhador(a), para a população negra, não é apenas uma data de comemoração, mas de denúncia. Denúncia do silêncio histórico sobre o papel da escravidão na estruturação do trabalho. Denúncia das políticas públicas que ignoram o recorte racial em programas de emprego e renda. Denúncia da lógica empresarial que usa o discurso da meritocracia para perpetuar privilégios e desigualdades.

Ao mesmo tempo, é uma data de afirmação. Afirmação da dignidade do trabalho negro. Afirmação do direito à reparação histórica. Afirmação de um futuro em que trabalhar não seja sinônimo de se submeter, mas de viver com plenitude, reconhecimento e liberdade.

A ABPN e a defesa do trabalho com dignidade

A Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as reafirma neste 1º de Maio o compromisso com a luta por um mundo do trabalho mais justo, onde as pautas raciais não sejam secundarizadas, mas compreendidas como centrais. A pesquisa acadêmica negra tem produzido saberes, dados e análises fundamentais para compreender as conexões entre racismo, trabalho e desigualdade, apontando caminhos para a superação desse sistema.

Neste Dia do(a) Trabalhador(a), que possamos honrar a memória dos que vieram antes de nós e que possamos lutar por um presente onde o trabalho não nos mate, não nos adoeça, não nos exclua – mas nos permita viver com dignidade e justiça.

Porque não há justiça social sem justiça racial. E o 1º de Maio é, acima de tudo, um dia de luta.

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